Caso Sônia: MPT integra ato global, com Ministério de Direitos Humanos e Cidadania, outras entidades e ativistas, em defesa da mulher negra e surda com 40 anos em situação análoga à escravidão
O ato global foi lançado na quinta-feira (6), e marca um ano de resgate de Sônia Maria de Jesus, na casa de um desembargador, em Santa Catarina
Florianópolis - O Ministério Público do Trabalho ( MPT) se uniu ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), ativistas e instituições, na quinta-feira (6/6), em uma campanha internacional pela defesa dos direitos de Sônia Maria de Jesus, mulher negra e surda, que nunca aprendeu Libras (Língua Brasileira de Sinais), e foi mantida por 40 anos em situação análoga à escravidão pela família do desembargador Jorge Luiz de Borba, em Santa Catarina.
Na abertura virtual do ato, o Procurador do Trabalho Luciano Aragão Santos, coordenador nacional de combate ao trabalho escravo (CONAETE) do MPT, falou que umas das grandes preocupações que envolvem o caso Sônia, são as fortes retaliações sofridas por uma das autoridades que participaram do resgate iniciado no dia 06/06/2023, por supostamente ter vazado informações sigilosas da operação que já estavam disponíveis na mídia: “Uma verdadeira tentativa de deslegitimar a atuação dos órgãos que agiram dentro da mais estrita legalidade, observando a Portaria com o fluxo nacional de combate ao trabalho escravo, todos os requisitos legais, inclusive com autorização prévia para a fiscalização”, lamentou. Foi enfático ao afirmar que “é importante que as autoridades que atuam nessa matéria tenham o respaldo do Estado brasileiro para exercer seu trabalho tranquilo, sem sofrer represálias, independente de quem está sendo investigado”.
O Procurador lembrou que o MPT atua no combate ao trabalho escravo desde 1995, já realizou mais de 60 mil resgates, sendo que o primeiro referente a trabalho doméstico ocorreu em 2017. De acordo com ele, é algo recente, que geralmente envolve mulheres negras e gera revolta das pessoas beneficiadas com os serviços prestados por estas pessoas. Um trabalho que começou e se concretizou há anos, uma verdadeira violação de direitos, uma subpressão da total autonomia das vítimas, uma cultura escravista enraizada na sociedade que entende que a trabalhadora doméstica não é digna e merecedora dos direitos assegurados aos demais trabalhadores, sob o argumento de que são da família”. Luciano considera esse argumento nefasto. Para ele, mesmo que o empregador ou o empregado queira ter uma conexão mais familiar, isso não é impedimento para que se cumpra a Lei ou que seja argumento usado para desviar a concretização da relação do trabalho.
Aragão detalhou os três eixos de atuação do MPT para o combate ao trabalho escravo e explicou que nesse contexto, com toda a condutas e o trabalho sério das instituições envolvidas, com base no Código Penal e em jurisprudência de decisões de Cortes Superiores, foram colhidos elementos suficientes para concluir o caso da Sônia, sim, trabalho análogo à de escravidão, degradante e forçado. Degradante por não ter acesso à educação, especialmente à língua dos sinais por se tratar de uma pessoa surda e apresentava problemas de saúde identificados pós-resgate, e forçado por nunca receber salário ou qualquer outra verba trabalhista ao longo dos 40 anos que viveu na casa dos patrões, após ser retirada da família biológica que hoje luta para ter a Sônia de volta e atender o sonho da mãe que morreu numa busca incessante para resgatar a filha.
Outras autoridades usaram a palavra em defesa de Sônia. A secretária nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Anna Paula Feminella, foi enfática. “Precisamos reconhecer que a Sônia tem sido submetida a inúmeras violações de direitos e esse caso é ainda mais emblemático por se tratar de uma mulher negra com deficiência, que passou a vida sendo subjugada. O capacitismo, a qual é a discriminação em razão da deficiência e está presente nas instituições, tenta normalizar esse tipo de prática. Além disso, as pessoas que visitavam aquele ambiente em que Sônia tinha sua dignidade violada, por exemplo, achavam normal aquele tipo de situação", disse Feminella.
O lançamento da campanha também contou com a participação de familiares de Sônia, artistas e representantes de entidades da sociedade civil, como a Comissão Pastoral da Terra, o Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e a Secretaria da Deficiência de Montevidéu, do Uruguai.
Atualmente, por decisão judicial, Sônia Maria de Jesus voltou à casa do magistrado, que entrou com um pedido de paternidade socioafetiva. Enquanto isso, a família biológica luta na justiça para libertá-la e apresentou, por meio da Defensoria Pública da União (DPU), um pedido de habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF).
Veja a íntegra na live da página do YouTube do Ipeatra Instituto.
Fonte: Assessoria de Comunicação MPT-SC
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Publicada em 10/06/2024